sexta-feira, 16 de abril de 2010

Os vira-latas com narinas de cadáver.

"O Brasil só perde a Copa para ele mesmo", assim disse Dunga em uma entrevista coletiva recentemente. Não, amigos, não é verdade. Se todos jogarem aquilo que sabem, amigos, o Brasil perde a Copa para, pelo menos, três times: Inglaterra, Espanha e Argentina. Acontece que em uma Copa do Mundo nem todos jogam o que sabem (Ronaldinho, em 2006; Maradona, em 1982) e uns poucos jogam até o que não sabem (Kléberson, 2002 e Squillaci, em 1990), e, por isso, apenas, por isso, podemos ser campeões. Cresci, meus amigos, achando que o futebol brasileiro era o melhor do mundo. Cresci achando que poderíamos ter ganho todas as Copas (a exceção de 1930, 1934, 1954 e 1974) não fosse a obra do azar e da sorte. Cresci achando que tínhamos os cinco melhores jogadores de todos os tempos: Pelé, Zizinho, Garrincha, Zico e Romário. Cresci achando que nada poderia nos parar, se quiséssemos vencer. A ginga e o jogo, diria Armando Nogueira, estão no "sangue do brasileiro", e isso faz com que os jogadores aqui nascidos sejam melhores, é claro. Nos esquecemos do seguinte: que o futebol é o esporte mais praticado do mundo. E, todos em qualquer momento, podem produzir jogadores magnânimos, se boa a safra. Maradona não nasceu no Brasil. Eusébio não nasceu no Brasil. Kopa, Platini, Zidane, Hagi, Stoichkov, Cruijff, Beckenbauer, Bobby Charlton. Ninguém, ninguém nasceu no Brasil. Mas estes, é verdade, ainda tive a sorte de compreender a sua importância, porque desde cedo tive curiosidade para conhecer a "História das Copas do Mundo". É verdade que, para nós, brasileiros, só existia a Copa do Mundo e durante alguns anos, apesar de ler absurdamente sobre futebol, fiquei sem conhecer as proezas de um George Best ou de um Sir Stanley Matthews por anos a fio...E eles foram grandes em seu tempo, Garrincha, quando surgiu, era chamado de Stanley Matthews 'brasileiro', pelos europeus. Tudo isso, tudo isso, pela arrogância nacional. Arrogância que não percebe como alguém pode achar Maradona melhor do que Pelé. Ou Beckenbauer melhor do que Garrincha. Eu não acho, digo logo. Garrincha e Pelé pertencem a um outro país (que, repito, não é o Brasil!). Nasceram no planeta dos grandes, planeta que viu surgir um Picasso, um Mozart, um Mandela, e toda a sorte de gênios. De qualquer forma, compreendo e respeito essa opinião, afinal Maradona fez o possível e o impossível no futebol. E Beckenbauer foi um tremendo jogador. Hoje, no entanto, sofremos de um duplo problema: a arrogância à brasileira, que perdura, como na frase de Dunga, e a inferioridade latente em relação ao futebol europeu. Lá, indiscutivelmente, se joga o melhor futebol. E em terras brasílicas: o que se joga? Quão o futebol brasileiro é pior do que o futebol europeu? Quão é diferente? Jogar bem aqui significa estar preparado para o sucesso internacional? Não tenho respostas imediatas a esta perguntas. Digo que tudo me parece ser muito mais uma questão de "estilos de jogar" do que propriamente desigualdade e diferenciação técnica. (Devo escrever sobre isso em breve)Cabe concluir, porém, que a arrogância brasileira ruiu em meio a onipotência cristalina do futebol europeu: a geração do futebol europeu, que assiste mais Barça e Man. United do que o próprio clube, sofre constantemente com o "complexo de vira-latas" do século XXI.É incapaz de admirar jogadores de raro talento, como Neymar ou mesmo Ganso, bufando: "Na Europa, ele não faz isso...". Isso tudo afeta, obviamente, a maior preocupação de cada brasileiro, em especial, em ano de Copa do Mundo: o selecionado nacional de futebol, a "Seleção". De um lado, a arrogância à brasileira se mantêm firme e forte, acaba defendendo teses absurdas do tipo: Luís Fabiano é o melhor atacante do mundo, Kaká é melhor do que Cristiano Ronaldo, Torres e Villa só funcionan no Playstation, etc. Do outro lado, os que sofrem da "síndrome do vira-latas" do séulo XXI propugnam e se mantem firme por iguais bizarrias: Neymar é incapaz de jogar na Seleção Brasileira, jamais atuou na Europa! Torees e Villa são infinitamente superiores e melhores do que Luís Fabiano e Robinho, que jamais tiveram o mesmo sucesso na Europa, e assim sucessivamente. Creio que a sintese paradoxal e absurda de tudo isso é uma mescla de dois caricaturas rodriguianas que expressam um pouco o momento conturbado que vivemos em nosso futebol. A grã-fina de narinas de cadáver entendia lhufas de futebol, e era daquelas que, ao chegar no estádio, indagava acerca da existência filosófica e epistemológica do objeto esférico que ia de um lado a outro: "Quem é a bola?". Era um personagem símbolo da aristocracia em geral, que, normalmente, pode perder toda a sorte de capital econômico, mas se preocupa, quase que exclusivamente, em manter o seu status, razão do existir. Há alguns anos, o futebol brasileiro está falido. Não tem mais capital econômico para perder. O único capital simbólico em que podemos nos agarrar é o relativo sucesso dos jogadores brasileiros no exterior. A superioridade do jogador brasileiro ante o jogador europeu é a pedra angular da arrogância brasileira. Por outro lado, a inferioridade do futebol brasileiro em relação ao futebol europeu é o principal razão de ser do "novo complexo de vira-latas". Se formos brasileiros ao limite e quisermos fazer uma síntese macunaímiana, teremos a versão clarividente de um "vira-latas com narinas de cádaver". Eis o que perturba todo o brasileiro no século XXI.

Um comentário:

  1. Temos um pouco sim de "vira-latas com nariz de cadáver", concordo...não queremos perder nosso status de futebol-arte, reconhecido e admirado por outros países, e o defendemos como se fosse "a última cereja do bolo", mas, creio que esse comportamento surge pelo medo, o receio de perder uma das poucas coisas que dá uma alegria imensa em ser brasileiro, que é só botar uma bola de meia, dois chinelos montando o gol, que já está pronto, funcionando a todo vapor! sem precisar de canetada de político, ou do capital dos empresários...Nossas narinas metidas á grã-finas, na verdade, tem um medo muito grande em perder o cheiro daquele perfume, reconhecido por muitos, como de qualidade.

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