sexta-feira, 30 de abril de 2010

Kenny Dalglish, o Zico de Liverpool

Amigos,
        Este texto surgiu de uma afirmação feita por um amigo bastante interessante: "Não existe jogador da categoria de Zico ligado à história de um clube da mesma forma que ele ao Flamengo. Quando se pensa em Flamengo, pronto, a resposta imediata é Zico, ou vice-versa." Esta afirmação foi, na minha cabeça, pouco a pouco, transformando-se em indagação. Será verdade? Pensava, revirava os livros velhos, pesquisava na internet e nada. Realmente, a ligação Flamengo e Zico parecia ser única na história do futebol mundial. Poderia até encontrar algum jogador ligado a um clube; é o caso de Tom Finney, marco da estória do futebol inglês, ícone do Preston North End. Mas por melhor que tenha sido Tom Finney (e ele foi um excelente jogador) o Preston North End nunca foi o Flamengo. Franz Beckenbauer e o Bayern, talvez? Mas Beckenbauer, assim como Pelé, Maradona, sempre foi um ícone da Alemanha, não do Bayern de Munique. Beckebauer sempre será o Kaiser do Império Alemão; jamais o Rei da Bávaria. Cruijff? Cruijff, é verdade, tem uma ligação ímpar com o Barcelona, chegou a jogar pela seleção da Catalunha e batizou o nome do seu filho de Jordí, um nome claramente catalão. Mas Johann é um símbolo da Laranja Mecânica, não do Barça. E ele jogou por tantos clubes! Ajax, Feyenoord e uma dúzia de clubes que ninguém sabe o nome dos Estados Unidos. Minha última esperança: Di Stefano. É verdade quando se pensa em Di Stefano, imediamente,  Real Madrid vem à cabeça. Lembra-se do "dream team" dos anos 50, com Kopa, Puskas, Didi, Gento, Santamaria. Mas não me parece haver uma idolatria semelhante. Este time tem uma espécie de aura mítica, única na estória do futebol. Às vezes, tenho a impressão de que não existiu, foi inventado. E, cá para nós, a torcida do Real Madrid não é capaz de amar alguém com a mesma paixão que a torcida do Flamengo ama o Zico. Portanto, quando estava quase transformando a indagação em afirmação e dando o braço a torcer para este meu amigo, eis que um nome me vem à mente: o escocês Kenny Dalglish. Claro, que, em imediato, lembro de seu sobrenome: Liverpool F.C. Zico, "you'll never walk alone".
     Kenny Dalglish nasceu na Escócia no ano de 1951. Na infância, fora torcedor do Glasgow Rangers, mas, desesperado para jogar futebol em alto nível, começou nas categorias de base (academy) do Celtic F.C. Jogou por lá por doze anos, sendo seis no time profissional. Neste período conquistou três "doubles" (a Copa da Escócia e o Campeonato Escôces no mesmo ano) e um total de quatro campeonatos escoceses. Em 1977, para suprir a ausência da estrela guia da constelação liverpooldiana, Kevin Keegan, Dalglish transferiu pela soma recorde de 500.000 libras. (logo Trevor-Francis seria o primeiro a atingir a cifra do "um milhão"). Nem o mais otimista torcedor do Liverpool poderia prever o que estava para acontecer em Anfield. A chegada de Dalglish alterou radicalmente a história do clube. O Liverpool F.C viveria sua "golden age", com Dalglish à frente do time. Algo muito parecido com o que o Flamengo viveu com Zico à sua frente. O Liverpool tornou-se, sem soma de dúvida, o maior time da primeira divisão inglesa e um dos melhores da europa, um verdadeiro esquadrão futebolístico. Nos anos que se seguiram, a chegada do infernal galês Ian Rush apenas serviu para consolidar a posição do Liverpool como um time quase-imbatível. Aos céticos, bravos defensores da arrogância à brasileira e que acreditam, fielmente, que não existem bons jogadores de futebol para além da praia de Copacabana, algumas conquistas de Dalglish: no total, em nove anos de clube, foram seis campeonatos ingleses, quatro "Ligas dos Campeões da UEFA" e, o feito mais incrível, a famosa dobradinha na temporada 1986 (em séculos de história, só Arsenal, United e, mais recentemente, Chelsea alcançaram tal feito). A final da FA Cup de 1986 é um marco histórico por vários motivos. Primeiro, é a final pós-Heysel. O jogo acontece logo após a tragédia de Heysel, que havia ocorrido poucos meses antes. Segundo, é a primeira vez que um time de determinado país joga sem um "nascido" naquele país na estória do futebol mundial em uma final de um torneio grande. O Liverpool não tinha um inglês, não confundir com britânico, na sua esquadra. Do goleiro (que nasceu no Zimbwabe) ao ponta-esquerda (nascido na Dinamarca), todos eram estrangeiros. Ou seja, um marco da globalização do futebol que marchava em alta velocidade. Terceiro, o jogo era contra o Everton. Um dos maiores rivais do Liverpool, que à época tinha um timaço com Lineker comandando o ataque. O quadro estava montado. Mas a parte vermelha da cidade não deu chance à parte azul, e venceu o jogo por 3 a 1. Querem mais? Dalglish, além de jogador, era treinador. E se tornou o primeiro "player-manager" a se sagrar campeão da FA Cup.

Na carreira de treinador, ainda, Dalglish é o único que conseguiu na Premier League quebrar a hegemonia de  Arsenal, Chelsea e Manchester United. Na temporada 1994-1995, levou o Blackburn de Alan Shearer, a conquista do título nacional.

Foi duas vezes eleito o melhor jogador do campeonato inglês, 1979 e 1983. E o segundo maior jogador da Europa perdendo para o maior jogador francês de todos os tempos, Michel Platini. É o maior artilheiro e o jogador com mais convocações da Seleção Escocesa. Foi eleito em votação pela torcida do Liverpool como o maior jogador de todos os tempos que passaram por Anfield Road.

Esqueçam tudo o que vocês pensam sobre futebol inglês. Esqueçam se vocês acham que Steven Gerrard é o maior jogador da estória do Liverpool. Ele ocupa a segunda posição. O primeiro lugar é apenas de um homem: Kenny, "The King", Dalglish. Kenny é a prova absoluta de que o Buckingham Palace não é a casa exclusiva da família real. Alguns de seus membros também moram em Liverpool. Mais precisamente, em Anfield Road. Palmas para "The King".

Zico contra Dalglish

Zico enfrentou Dalglish por algumas vezes. Contra os que acreditam que o Liverpool utilizou o time reserva, Dalglish esteve na final de 1981, quando o Flamengo venceu por 3 a 0. A verdade, porém, é que os times europeus nunca levaram este "Mundial" muito a sério. Sempre convictos, a arrogância à européia, de que tiveram o melhor futebol do mundo, o verdadeiro título sempre foi a Liga dos Campeões da Europa. Recentemente, assistindo a um documentário no Youtube., vi esta partida sendo tratada como o "amistoso" entre o Benfica e o Santos. "Friendly Match".
Dalglish disputou três Copas do Mundo, 1974, 1978, 1982. Em 1982, jogou contra o Brasil, mas não começou como titular por estar sentido um problema físico, entrou no lugar de Andy Gray (narrador da Sky Sports). O resultado do jogo, 4 a 1 para o Brasil, com Zico marcando gol...Mas isso não importa muito. Importa comparar que a idolatria  que os torcedores do Liverpool tem para com Dalglish é equivalente ao amor do torcedor rubro-negro com Zico.

Vou além: acho que ambos estão no mesmo patamar de craques do futebol mundial, ao lado dos grandes, Maradona, Michel, Rummenigge... Lembrarei sempre de Eto'o, que, quando era um jogador espetacular no Barcelona, disse, sem razão, que "não ganhava o prêmio de melhor do mundo", porque não se chamava "Etoodinho"... "Dalglishinho" talvez fosse muito mais respeito entre nós do que Kenny Dalglish é.

Vídeos:

Aqui dois vídeos, o primeiro de Dalglish at his best, o segundo ele jogando o "jogo das estrelas" em Anfield e fazendo, não falei que era igual ao Zico? :
http://www.youtube.com/watch?v=XvHQV76OT4A&feature=related
http://www.youtube.com/watch?v=Dxw_XTnZ1RY&feature=fvst


Este texto sobre o Dalglish inaugurou uma espécie de coluna minha, que será sobre grandes jogadores que fizeram história no futebol, principalmente, aqueles desconhecidos do público brasileiro.



4 comentários:

  1. Fala pra eles que o amigo fui eu, fala!rs

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  2. Aí é q tá. Na Inglaterra eles sabem quem é o Zico.

    Nada, absolutamente nada no futebol mundial será como ZicoFlamengoFlamengoZico. A palavra de Zico é sempre ecoada na Gávea, mesmo ele não tendo a menor ligação com diretoria, elenco ou coisa do tipo. Ele tá acima disso. Ele é o único mortal que pode se confundir com o imortal Flamengo. Ele é o Flamengo, e isso não é blasfêmia.

    E vc poderia citar Maradona e Napoli e Maradona e Boca.

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  3. Pois é Maradona-Napoli, Maradona-Boca. Já são dois clubes, já fere o argumento. A ideia é um jogador que, se pensar no nome dele, pensa no clube. E o Maradona, sei lá, eu penso que a torcida do Boca o ama, a torcida do Napoli o idolatra... Mas... quando eu penso em Maradona, penso: 'La Mano de Dios", não no Napoli. É exatamente o caso do Kenny Dalglish, e acho bem parecido com o Zico.

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  4. Quando se fala em Maradona, se pensa automaticamente em Argentina, não tanto em boca e em Napoli, eu acho.
    O Lugui usou ele como argumento e eu usei essa ligação pra deslegitimar. Muito pelo fato do Zico, infelizmente, não ter ganho uma copa. Talvez, assim, fosse associado à seleção brasileira.

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